segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

O Caçador de Pipas


Publicado em 2004, o romance O caçador de Pipas, de Khaled Hosseini, logo se tornou um best-seller. Trata-se realmente de uma bela história sobre amizade, culpa e guerra. O filme é uma adaptação muito bem feita desta obra. Dizer que o livro é sempre melhor que o filme, é lugar comum. Afinal, quando lemos um livro, somos nós quem criamos as imagens na nossa cabeça, e damos maior ou menor importância à cada cena e a cada personagem. O filme é a interpretação de um diretor. Porque estou dizendo isso? Porque tem muita gente dizendo que o filme é menos dramático do que o livro, que diminuiu a força da história. Aqui eu vou tentar analisar o que eu vi, e não se o livro é melhor do que o filme, ou vice-versa.

Já na primeira cena do filme, Amir recebe a ligação de um velho amigo que lhe diz “ainda há um jeito de ser bom de novo”. Tomando essa frase como ponto de partida, o filme já cria a expectativa de uma boa história, pois o personagem que nos foi apresentado não aparenta ser uma má pessoa. O que teria acontecido então? A partir desse ponto, temos o Afeganistão da década de 70 como cenário, e uma bela e triste história sobre a amizade de dois meninos afegãos. Com certeza é uma das mais emocionantes histórias de amizade que eu já vi no cinema. A amizade incondicional de um menino por seu amigo e patrão.

Amir, filho de um rico empresário, sonha em ser escritor, profissão que desagrada ao pai. Mas essa não é a única crítica que Amir sofre de seu Baba. O jeito mais quieto do menino, e sua passividade diante de situações de confronto deixam Baba constantemente preocupado e decepcionado. Amir, que já carrega a culpa do falecimento de sua mãe, que morreu durante seu parto, sente-se sozinho, sabendo que não tem o amor completo do pai. Hassan, filho do empregado, é o único e verdadeiro amigo de Amir. Mas é também um empregado, e Amir sabe utilizar isso a seu favor. Quando precisa de um amigo para ir ao cinema ou contar as histórias que escreve, logo chama Hassan, mas quando não o quer por perto, o dispensa com frieza.

Só por conhecer o personagem de Hassan, o filme já valeria à pena. Ele é uma daquelas raras pessoas que só carregam bondade no coração. Apesar das terríveis situações por que passa na infância por causa de Amir, e da vida sacrificada que tem depois da invasão russa ao Afeganistão, não perde a sua essência, que é toda feita de amor e sinceridade. Um carta que ele escreve a Amir, muitos anos depois que Amir e seu pai fogem do país, revela sua ingenuidade e pureza de sentimentos.

O diretor constrói muito bem o caráter dos personagens, e os atores respondem à altura, sendo muito convincentes. Não é aquela coisa forçada que poderia fazer soar falsa e dissimulada a covardia de Amir e o amor de Hassan. Pelo contrário, tudo que é mostrado até a parte em que Amir, já adulto, retorna ao Afeganistão, parece ser muito natural, muito real. Tenho algumas reservas com relação à última parte do filme, quando Amir vive uma aventura para resgatar o filho de Hassan, e, principalmente, para se redimir de seu grande erro do passado.

A situação política e social do Afeganistão também é focada nesta obra. Após a invasão Russia, os afegãos perderam a liberdade e a dignidade. O filme retrata a devastação do país e da população que não pode fugir do massacre dos grupos radicais que tomaram o poder. Mais um aspecto triste do filme, principalmente, porque essa parte não é ficção.

Não posso deixar de mencionar uma cena muto bem feita do filme, que é a competição de pipas. Não me lembro de ter visto nada parecido no cinema. Primeiro, o próprio destaque que é dado à pipa, um elemento universal da infância, e que neste filme também é uma metáfora da liberdade, algo que é tomado dos afegãos. Depois as cenas que mostram as pipa do alto, e a cidade em baixo, como pano de fundo, são maravilhosas.

O final não decepciona. Felizmente, Hollywood não trocou o final da obra original por um final super feliz. O passado dos personagens é muito marcante para que eles pudessem esquecer tudo e viver uma “vida feliz na américa”. Se para alguns personagens a vida até tende a melhorar, para grande parte dos afegãos restam poucas esperanças de voltar a viver em paz.


Nota 9/10

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